[Prisca Agustoni (Lugano/Juiz de Fora)]
DESCASCAR A FRUTA
Dobra triste o dois de novembro:
são dias e noites e mais dias
devorados pela luz
cínica do sol alto nos trópicos
reluzente entre os verdes da mata,
como árvores de raízes inversas
que se dispersam no céu,
enquanto nós, reféns do vidro
e do medo, descascamos laranjas
para ofertá-las aos vivos,
e nesse mínimo gesto
construímos nossa casa, um chão
de espera, o sabor cítrico
circulando corpo adentro.
Porém dobra triste o dois de novembro
nos trópicos, sob o sol ardente
em nós, lenta, macera a fruta
e a consciência do que finda.